sábado, 27 de setembro de 2008

Meu querido e doce G.

Há pessoas que são realmente especiais. Que vivem num terrível grau de dependência mas mantêm uma atitude tão correcta e serena perante a sua situação. Por serem exemplos de vida, para mim e para todos, passo muitas vezes algum tempo extra-trabalho a pensar neles e a tentar compreender, assim de longe, como conseguem manter-se tão apaixonadamente abraçados à vida.
O G. é um homem tão grande. Tão grande e tão doce. Tão grande e tão meiguinho. O G. não é português mas foi por cá que sofreu um acidente e ficou tetraplégico. Fala português correctamente, baixinho e devagarinho com toda aquela calma que o caracteriza. O meu coração enche-se de orgulho por dele. Porque é sempre tão gentil e porque tem um sorriso tão verdadeiro, tão inspirador.
Não podia falar do G. sem que imediatamente me lembre da sua mulher. A sua dedicação diária e incansável é das mais bonitas declarações de amor que presenciei. Ela pega nele sozinha e cuida dele sem que precise de mais ninguém. Atendendo ao seu tamanho e ao seu peso concluo que o amor entre duas pessoas, assim verdadeiro, cria forças sobrenaturais.
Ontem eu vinha a sair, e ela a chegar. A pedalar serra a cima na sua bicicleta. Lá ia cheia de força, daquela que tem origem cá dentro e a faz não ter limites, ou pelo menos a permite ultrapassá-los. O G. nunca está sozinho. Mas sei que ele merece. Merece por ser como é. Um homem muito para além de um corpo, e amado, muito amado para além disso também.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Vitaminada


Andava a arrastar-me. Entre noites manhãs e tardes, seguidas e a todo o vapor, o meu corpo já não conseguia acompanhar o meu horário de trabalho.
Houve mesmo uma manhã em que pedi ao meu colega M. uns minutos de compaixão e deitei-me na marquesa do serviço para ver se respirava melhor. Tenho má cara. É certo que o verão passou, o bronze já se foi, e o mau aspecto que a minha palidez revela não esconde as horas de sono em falta. Sentia-me profunda e completamente exausta.
A Nat, minha salvadora em todas as horas, recomendou-me estas vitaminas. São naturais. São maravilhosas. E eu sinto-me cada vez melhor. Adormeço e durmo horas seguidas, acordo com energia, aguento as noites de trabalho sem ter medo de desfalecer a qualquer momento e deixei de pensar que o meu coração pode parar a qualquer instante.
Eu precisava que a neurótica Di se fosse embora e que eu e a minha energia voltassem.
Benditas, benditas sejam.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Outono

O Outono chegou com cheirinho a terra molhada.
Eu gosto do Outono.
E de beijos.
E de ti.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Cair do Céu

Não sou da família do Paulo Bento mas a tranquilidade fica-me mesmo bem. Para mim estar tranquila é estar em paz, profunda paz interior. Todos os outros maravilhosos sentimentos que possam vir até mim, na tentativa de me deixar e fazer feliz, de nada valem se não trouxerem consigo, tranquilidade.
Esta.
Buscas incessantes por ela marcaram fases específicas da minha vida. Houve alturas em que mesmo tendo um aparente quase tudo eu tinha um desassossegado quase nada pela ausência da mesma.
Não me atrevo a pensar sequer por instantes, que não a mereço nesta plenitude como a sinto agora. Mereço sim. Mereço este bem-estar, mereço este dia a dia em que me sinto útil, realizada e feliz.

"Se eu escorregar
céu abaixo
atiras-me um cometa
para me paraquedear
ou então
põe-me uma nuvem
branca e escura
como uma cama de água quente
embaixinho dos meus pés
para eu me deitar
ou então
joga-me o sol
como um balão brilhante
iluminando a fogo e ouro
o meu escorrega céu abaixo.”

(Cair do Céu-Maria João e Mário Laginha)

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Grandes vitórias.

- D. M. já deitada a estas horas?
- Levei uma tareia enfermeira (olhinhos que brilham)
- Que aconteceu? Treinou muito no ginásio foi?
Confessa-me entre sussurros e sorrisos.
- Hoje voltei a andar. A terapeuta C. foi ao meu lado e andei 90 metros com o andarilho.

Mesmo quando se tem quase 75 anos é bom ver a esperança a determinação e a vontade de recuperar. Melhor ainda é o dia em que encontro os meus doentes, tão dependentes no início do internamento, a caminharem, mesmo que com ajuda e passos pequenos. Vê-los treinar todos os dias, ver o esforço e empenho de toda uma equipa que trabalha junta para reabilitar.
Os dias das pequenas e grandes vitórias fazem com tudo valha a pena. Mesmo quando se vivem algumas frustrações.
Nesta noite a D. A. adormeceu mais feliz do que nunca e na manhã seguinte queria ser a primeira a voltar para o trabalho. Fico a vê-la ir, corredor fora, cabelinhos brancos, passo a passo.
E sinto muito orgulho.

sábado, 6 de setembro de 2008

Maravilhas.

Dormir. Dormir e dormir.

Acordar com a chuva lá fora.

Olhar assustada para o despertador.

É sábado são 8h da manhã.

Estou a ouvir chuva no Algarve.

Voltar a adormecer.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

As coisas, como são.

Uma atitude positiva perante a vida é para mim uma coisa que se aprende. Que se adquire com muito esforço e empenho. Não nascemos optimistas ou pessimistas. Decidimos sê-lo em momentos cruciais.
Faço transformações diariamente. Positivas, em relação a mim e a todos que estão comigo perto ou longe. Fecho os olhos e envio energias positivas que alimento com amor todos os dias.
Ainda não desisti de encontrar a chave do carro. E os meus poderes profundos aplico-os tanto a factos banais como este, sem importância e completamente substituíveis, como nos que acredito, se calhar sozinha e sem saber porquê.
No dia em que perdi a chave do carro e andava com cara de morta viva, com uma impressão no peito que já não sentia há muito tempo, deu entrado no serviço onde trabalho a A. Pela primeira vez senti que poucos ganhos conseguiríamos. O acidente que sofreu deixou a A. num estado físico brutal. Revoltei-me comigo. E pensei. Porque não acreditas em nada? Será isto a chamada imunidade que se adquire com o tempo de serviço? Estarei apenas a ser realista?
Durante a noite, encontrei a A., que não fala nem se exprime muito, nem tem como dizer o que sente, nem se consegue mexer, nem gritar, encontrei-a quietinha e calma. Olhos bem abertos, repletos de lágrimas. Chorava sozinha e em silêncio. Deixei-me estar perto dela. Não lhe disse que estava tudo bem, nem que ia ficar boa. Peguei numa toalha, limpei-lhe as lágrimas e deixei-a chorar. Apaguei a luz e saí.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Doutor, preciso de ajuda.

Ser esquecida distraída e tonta. Dou por mim a perder metade do meu dia a remediar o que faço de torto na outra metade. A ir buscar o que me esqueci, a trazer o que levei comigo por engano, a dar um recado que ficou por dizer. Dou por mim a esquematizar várias soluções para este meu problema. Perco com isto aquelas horas que se prolongam para além das 24 de um dia normal que apenas se atribuem a pessoas normais, algo que não sou, para grande pena minha.
Perdi por ultimo, depois da chave do cacifo, do cartão Multibanco e uns óculos de sol (reencontrados horas depois por amigas dentro do meu próprio carro, tendo eu viajado horas em cima dos mesmos), perdi a chave do meu carro. Este último facto deixou-me em pleno estado de perturbação no resto do dia.
Quem me dera ter tudo gravado na minha mente. Andar para trás e para frente com a fita. Não antecipar e corrigir o que faço de mal, mas rever o exacto momento em que me escapa sempre qualquer coisa.
A minha mente não grava. A minha mente desliga.
Como me disse minha querida Rita. Não há nada que a uma boa noite de sono não cure.
Desejo arduamente que isso seja verdade.
 
Site Meter