domingo, 1 de novembro de 2009

O.

A O. é uma senhora linda. Está internada há já algum tempo a recuperar devagarinho de um AVC que a deixou sem que consiga exprimir-se com palavras.
Repete vezes sem conta ao longo do dia bó bó para tudo o que precisa de dizer, pedir ou agradecer. Não compreende tudo o que lhe dizem, e por isso tento falar-lhe sempre baixinho, devagar e repetindo várias vezes. De vez em quando meto-lhe um rebuçado de frutas na boca e ela fica muito contente.
Esta semana foi-lhe dito que terá alta. Vi-lhe os olhos azuis torneados de vermelho de tanta dor.
Tentei tirá-la da cama para irmos apanhar sol. Respondeu bó bó e o estender de braços fez me perceber que sim. Que queria.
Sentei-me no muro, as minhas mãos e as dela juntas. Repetiu bó bó e bó bó como se tudo fizesse sentido. Olhava para mim nas pausas. E perguntava-me com o olhar se não achava que ela tinha razão. Apontou para os dedos em sequência, bó bó bó bó. Chorou.
Fechava os olhos muito tempo.
E quando os abria olhava para mim.

2 comentários:

nat disse...

...

Bacouca disse...

Querida Di,
A O. queria levá-la consigo...Mas tenho a certeza que a leva no coração como todos que conhecemo-la!
Milles

 
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