sábado, 1 de outubro de 2011

Amor

Eles vieram de férias mas ela caiu à chegada a Portugal, ainda no aeroporto uma queda grande, que lhe provocou uma grave fractura. Velhinhos, holandeses, não falam uma palavra de Português e ele tenta falar um pouco inglês, mas quase nada.

Entraram pelo serviço ás 3 da manhã, ela cheia de dores, ele exausto. Ela falava comigo em agonia, uma língua de trapos. Foi uma comunicação difícil a nossa. Eu explicar-lhe que tinha que despi-la, mexer-lhe, pôr-lhe um soro, algalia-la. Tudo isto por gestos, com sorrisos, com festas na cara como que a dizer-lhe que estava ali e ia ajuda-la, ia cuidar dela. Ele não arredava pé. Sempre por perto, quase que a impedir-me de lhe tocar tamanhas eram as dores que isso lhe provocava. Tentei explicar-lhe, pensei na linguagem universal que nos une enquanto humanos, a única que nos poderia aproximar naquele momento.

Horas de trabalho árduo depois deixei-os no quarto. Disse-lhes que dormissem, que amanhã se resolveria o resto, que no botão vermelho bastava tocar para eu aparecer a qualquer hora.

Quando os voltei a espreitar por volta das 6h, ele estava descalço, de calças de fato e tronco nu ao lado da cama dela. Com a cabeça encostada à dela, como se este toque lhe pudesse dar o colo que ela precisava. E pensei no amor, sempre ele. Como a melhor coisa da vida, no companheirismo, na amizade que cura corações rompidos da pele ao músculo. Pensei que os analgésicos até a tinham aliviado, mas ali ao seu lado ela tinha o melhor curativo do mundo, o amor. Fiquei parada à entrada do quarto, comovida, grata por poder presenciar de perto algo tão inspirador, tirar a minha própria lição daquilo que via.

Quando me aproximei ele continuou ao seu lado. Enquanto inevitavelmente lhe causava algumas dores com a medicação da manhã, continuaram aos beijinhos, ele com o braço enrolado de volta da cabeça dela, curvado na cama, velhinho, cansado, descalço e em tronco nu. Sempre ali, sempre juntos.

2 comentários:

Patrícia disse...

Lindo o texto e igualmente linda a imagem dos dois e desse amor :)
Quero um amor assim, para a vida toda, com muito respeito, amizade, companheirismo... :)

Bacouca disse...

Querida Di,
Amores desses só nos passam uma vez na vida...
Um beijo grande

 
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